A experiência com a recuperação da mata atlântica no Instituto Terra, em Aimorés, leste de Minas Gerais, comprova que a cobertura vegetal traz de volta uma riqueza fundamental para o futuro da vida: a água. Mostramos aqui o trabalho de pesquisa e educação ambiental dentro do Instituto, mas o esforço para recuperar as milhares de nascentes que secaram na bacia do rio Doce se estende para fora dos limites da reserva.
“Nós estamos no final da estação das águas e no meio de uma seca. Isso é grave. Por isso, vamos a certos lugares que nem estrada tem, em propriedades em que a máquina não passa, e sempre converso com o produtor: olha a importância dessa água que tá saindo aqui. Essa água encanada muitas vezes mata a sede de 100 famílias”, explica Gilson Oliveira, gerente de projetos do Instituto Terra.
O desgaste do solo ao longo dos anos secou a terra e fez desaparecer a água de milhares de nascentes pelo Brasil. Segundo o MapBiomas -uma rede colaborativa, formada por ONGs, universidades e startups de tecnologia, que produz mapeamento anual da cobertura e uso do solo e monitora a superfície de água-, os dados coletados a partir de 1985 mostram que todos os biomas do país perderam superfície de água e que a última década, entre 2013 e 2022, foi a mais seca da história.
Na bacia do rio Doce, as secas de 2014 e de 2017 estão vivas na memória dos produtores rurais, como Luís Aygnes, que tem plantação de milho e cria gado para venda de leite no Baixo Guandu, no Espírito Santo: “Eu vi muito gado morrer de sede. Meus vizinhos puxavam com trator ou deixavam no pasto”.
O levantamento do MapBiomas indicou que um dos motivos para a redução da água na região é que a vegetação natural da mata atlântica e do cerrado foi substituída por áreas agrícolas, pastagens e pela urbanização. Por isso, o método para a restauração das nascentes começa com a proteção dos olhos d’água.
“O Instituto doa os insumos para o cercamento, que é o grampo, estacas, esticadores, o arame farpado. Depois, tem o preparo do solo, o plantio e o Instituto doa o adubo, o formicida e as mudas. O produtor tem que fazer o trabalho de cercar e cuidar. O objetivo é ter uma vegetação ali”, conta Gilson.
De 2010 até 2023, o Projeto Olhos d’Água do Instituto Terra conseguiu parcerias com empresas, governos, fundações do Brasil e de outros países e até doações de pessoas físicas, para proteger 2 mil nascentes na bacia do rio Doce. Produtores de 21 cidades de Minas foram atendidos e de oito cidades do Espírito Santo, onde conhecemos o produtor rural Luís Aygnes.
Há 3 anos, seu Luis se cadastrou para participar do projeto e agora mostra o resultado numa das nascentes da propriedade.
“A nascente estava seca de tudo, de não correr água. Não tinha como o gado beber aqui. Agora você pode olhar, ela não para de correr e ajuda a encher meu poço. Estou criando até peixe. Aqui, eu não deixo o gado pisar, não deixo essa nascente secar mais”.
O técnico ambiental Jonas dos Santos explica que o cuidado tem que ficar a cargo do produtor.
“O Instituto doa o material, mas o produtor tem que conseguir a mão de obra ou ele mesmo fazer o trabalho, porque a gente acredita que é uma parceria. O produtor tem que querer cuidar da nascente”, diz Jonas.
O Instituto conseguiu uma parceria para estender o projeto por mais seis anos. Até 2029, a meta é proteger mais 4 mil nascentes na bacia do rio Doce, de forma que o produtor também consiga manter as atividades de uso da terra.
“Nós sabemos que se o produtor não for pro azul ele não vai pro verde. Então é muito importante que ele passe a ter renda. O objetivo é fazer experimentos, intercalando áreas produtivas com áreas de cobertura vegetal. Só de o produtor falar pra você, ‘minha água não secou mais’… Eu encontrei dois produtores semana passada falando isso, então é muito gratificante, prova que nem tudo tá perdido”, diz Gilson Oliveira.