As recentes ondas de calor em Belo Horizonte e os números que mostram o aquecimento de Minas acima da média nacional não evitaram que a Prefeitura cortasse árvores no entorno do Mineirão para um evento da Stock Car.
A justiça proibiu os cortes em decisão liminar, mas pelo menos 12 árvores já tinham ido ao chão, apesar da manifestação de ambientalistas, vigília de moradores e nota da UFMG alertando para a falta de diálogo com a Prefeitura. A liminar foi cassada poucas horas depois. Quase um mês antes, no entanto, técnicos da própria Secretaria de Meio Ambiente emitiram parecer contrário à construção do autódromo na Pampulha e listaram pelo menos seis problemas.
No rito de licenciamentos para o autódromo, a Prefeitura optou por seguir as regras estipuladas para um “evento”, já que a corrida aconteceria uma vez ao ano. Nesse caso, as obras não foram tratadas como construção de grande porte, que exigiria outro tipo de licenciamento ambiental.
A construção do autódromo foi aprovada pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente da Prefeitura, contrariando parecer da própria Secretaria de Meio Ambiente.
Em 31 de janeiro, técnicos da SMMA listaram pelo menos seis problemas para a construção do autódromo no entorno do Mineirão:
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Obra em área de patrimônio natural e cultural: o autódromo ocuparia uma ADE – Área de Diretrizes Especiais – da Pampulha, de patrimônio estadual e nacional, protegido por IEPHA e IPHAN, além de uma ADE da bacia hidrográfica da Pampulha.
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Corte de árvores protegidas por lei: dentre as 73 árvores com previsão de corte, 54 são de espécies nativas, como Pau Ferro, Ipê Roxo, Ipê Amarelo, Macaúba e Paineira. E 19 são exóticas, como o Ipê Rosado, Framboyant e Tipuana. Ao todo, o projeto prevê o corte de 73 árvores, sendo que 14 são Ipês Amarelos da espécie Handroanthus serratifolius que, pela lei, é declarado de interesse comum, de preservação permanente e imune de corte.
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Danos ao corredor ecológico: o percurso previsto para a corrida é classificado por lei como “Conexão Verde”, porque interliga áreas de preservação ambiental importantes para formação de corredor ecológico na cidade.
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Ruído acima do permitido para pessoas e animais: a proximidade com o Hospital Veterinário da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) é o ponto mais crítico, tendo em vista os ruídos, não só dos eventos da corrida, bem como da própria obra.
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Contaminação de óleos na lagoa da Pampulha: é esperado um aumento da liberação de óleos a montante da lagoa da Pampulha, que serão carreados para dentro dela, aumentando assim sua contaminação, impactando, dessa forma, as espécies que se abrigam ali.
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Desconforto térmico (aumento da temperatura): o parecer lembra que as ondas de calor estão mais frequentes e que elas se intensificam quando há ausência de árvores. Portanto, dentre os impactos, em relação à supressão arbórea, o que o cidadão sentirá de imediato será no conforto térmico. A maioria das árvores a serem suprimidas proporcionam um razoável sombreamento, além da diminuição da poluição atmosférica, retendo particulados em suspensão do ar, e do sequestro e armazenamento de carbono, um dos gases de efeito estufa.
“Diante do exposto nos manifestamos desfavoráveis que a intervenção em espécimes arbóreos apresentada pela Sudecap sejam analisadas de forma isolada, sem considerar o licenciamento da corrida e os demais impactos que poderão ocorrer em virtude da realização desta”, concluiu a SMMA.
O Secretário de Meio Ambiente de Belo Horizonte, José Reis, anunciou a compensação de 688 novas plantas e disse que a Sudecap (Superintendência de Desenvolvimento da Capital) iria começar na sexta-feira, 1º de março, o plantio de 66 novas árvores na região da Pampulha. O Superintendente da Sudecap, Henrique Castilho, afirmou que todos os licenciamentos exidos para um “evento” foram feitos.
A UFMG publicou nota manifestando preocupação com o evento e informando que o poder público municipal não estabeleceu diálogo com a Universidade e a comunidade universitária.
Os coletivos de plantio e ambientalistas também se posicionaram contra e afirmam que a compensação de árvores é complexa: “O número de mudas plantadas é bem maior que o de árvores cortadas porque as mudas estão sujeitas a muito estresse e desafios até que consigam de fato se tornaram árvores.”
“Outro fator é que a compensação não é feita na mesma área, mas sim, em áreas degradadas e essas mudas ficam ainda mais vulneráreis aos incêndios e abandono. Uma grande parte dessas mudas vai morrer depois do plantio”, explica Cesar Pereira, do coletivo Bora Plantar.
Veja aqui o parecer técnico da SMMA (ou clique na figura):
Nós procuramos os organizadores do evento em Bel Horizonte, mas, até o momento da publicação desta reportagem, eles ainda não haviam respondido aos questionamentos. Assim que se manifestarem, a reportagem será atualizada.
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